sugestão para ouvir enquanto lê:
das coisas que mais tenho medo é restrição de movimentos, e isso é bastante vago e pode aparecer em muitos formatos. um dos que conheço há mais tempo é a claustrofobia.
lembro de ser criança e subir os cinco lances de escada que levavam ao apartamento da minha avó por ter a certeza que se eu entrasse naquele elevador velho ia sair de lá direto para o crematório ou para o hospital. eu subia de escada, enquanto meus pais e minha avó iam de elevador. eu temia por eles também, as vezes até achava que seria melhor entrar com eles e morrermos todos juntos porque ser órfã seria pior. mas o medo do confinamento era maior, então eu subia correndo e com a certeza que eles iam cair. se eu chegasse ao quarto andar antes do elevador, queria dizer que todos ficariam bem. e assim foi, eu corria os degraus só para garantir que a ordem do meu mundo (a.k.a a vida dos meus pais e da minha avó) fosse mantida.
isso não quer dizer que eu não peguei nunca o elevador de lá. peguei várias vezes, isso acabava reforçando o medo e a gratidão pela sobrevivência.
depois que eu cresci, subir de escada virou uma coisa saudável a fazer e meio que um rótulo que me identificava. na casa da minha outra avó, eram apenas dois lances. em prédios que morei, a maioria não tinha elevador então sem perigos. no interior, eu frequentava majoritariamente casas e lugares em que elevador não era opção.
escrevendo isso agora, fiquei pensando que - talvez - mais pessoas se acidentem em escadas do que em elevador… (verificar isso com uma pesquisa no scholar google e outra no deepseek).
mas, claro, que isso tudo não era sobre se acidentar necessariamente. era sobre estar confinada.
em vinte e cinco anos de preocupação com elevadores, apenas agora, em março de 2025 é que fui, de fato, viver esse medo e ficar presa em um. e foi horrível mas também um pouco libertador… acho que a fantasia do medo era pior do que a realidade (pelo menos nesse caso que me aconteceu).
eu estava chegando para fazer uma sessão de acupuntura, chamei o elevador. enquanto esperava fiquei me olhando no espelho. o porteiro diz: “jovem, o elevador”, percebo que um dos três elevadores do prédio está com as portas abertas na minha frente. entro e aperto o botão do quarto andar, as portas se fecham. dois segundos depois todas as luzes se apagam.
nesse instante, o tempo fica totalmente distorcido em uma viagem de medo. eu tenho a certeza absoluta que vou morrer e fico muito chateada que vai ser agora e desse modo. começo a apertar o botão do sininho do elevador mas nada acontece, pois estamos sem energia. estou tremendo e penso que não quero ligar para ninguém nem mandar nenhuma mensagem, porque não acredito que aquilo está acontecendo comigo. penso se vai ser muito dolorido, a morte, ou se vou ter um ataque do coração antes de me quebrar toda na queda/ser esmagada.
pego o telefone para tirar uma foto mas não consigo habilitar o flash de tão nervosa e tiro apenas um retrato assustador do mais puro breu.
por um segundo o pânico passa e tenho muita clareza de espírito (seria a aceitação do fim?). penso que não é possível que a humanidade fez uma máquina que carrega pessoas em alturas que, em caso de ausência de energia, irá despencar. isso me da forças para abrir a primeira porta do elevador com as mãos e começar a gritar por socorro. eu grito: “socorro, estou presa aqui no elevador! alguém pode me ajudar, socorro (…)”.
pouco tempo depois vem uma voz de cima e diz: “luiza?”. é a médica acupunturista que eu estava indo encontrar. depois, uma voz vem de baixo - eu entendo nessa hora que estou entre o terceiro e o quarto andar -, e pergunta se estou bem, se estou sozinha, fala que vai ficar tudo bem, que isso acontece e que logo a energia volta.
sento no chão e tento chorar. sem sucesso. respondo a voz do terceiro andar que estou sozinha, que não estou bem e peço que ela me ajude a sair de lá. a voz de um homem aparece no terceiro andar, ele começa a tentar abrir a outra porta e uma luz entra. mas a porta é muito dura. estou uns trinta centímetros no terceiro andar e o restante no quarto andar. falo para ele que não vou passar pelo terceiro pois é muito estreito, se ele pode subir no quarto andar para abrir a porta. ele fala que não acha que é uma boa ideia, que logo a luz volta. eu insisto e ele sai, em direção ao quarto andar. a outra mulher fica lá, tentando me acalmar.
imediatamente a luz volta.
(…)
tudo isso durou uns quatro minutos.
quando eu finalmente saí, vi que uma mulher no elevador da frente também sai. conversei com ela rapidamente e entendi que ela não ficou gritando por ajuda igual eu (rs).
meio envergonhada mas com a certeza de meu anonimato, subi até o quarto andar, agora de escadas [que são lindas, nesse prédio], e tive uma longa sessão de acupuntura.
no mesmo dia, mais tarde, tive que ir a um evento no décimo andar e subi tudo de escadas (desci de elevador, acompanhada).
hoje, já voltei ao uso rotineiro de elevadores.
ainda não falei disso na análise, vamos ver como eu elaboro… por enquanto, fico pensando que é muito doido ter um grande medo realizado, passar por ele - inclusive -, quase sem danos.
o medo segue, é maior que os elevadores. é sobre ficar constrangida/restrita. também sinto que houve uma conciliação humano-não-humano com o elevador rs. uma afeição estranha, mas ainda evitativa.
espero que tenham curtido esse texto e que o tom dramático não tenha sido muito exagerado, [agora] tenho me divertido com essa história.
usei umas analógicas antigas ao longo da cartinha, que acho que passam um pouco a energia desse texto de um jeito bonito até (e menos gráfico).

beijos, amo você! até outra
(ɔ◔o◔)ɔ lülu ⋆。𖦹°⭒˚。⋆*
ps: se você responder a este email me deixa mt feliz y só eu recebo s2 s2
amei esse texto!!! felicitaciones por ter sobrevivido !!!!!!!